Em 23 de outubro de 2021, o graneleiro NS Qingdao, transportando 1.500 toneladas de fertilizantes e reagentes industriais, atracou no porto de Durban, na África do Sul, no Oceano Índico. Durante a descarga, a água da chuva entrou no porão de carga e desencadeou uma reação química, libertando gases tóxicos. Após três meses de incerteza sobre o destino da carga reativa, as autoridades sul-africanas planeiam despejá-la em mar aberto.
“Por que razão o oceano está a ser usado para despejo de resíduos tóxicos quando deveríamos proteger os oceanos?” disse Liziwe McDaid, da ONG sul-africana The Green Connection.
Apesar de se referir aos gases como “tóxicos”, a Autoridade de Segurança Marítima da África do Sul (SAMSA) minimizou o seu potencial de prejudicar as pessoas e o meio ambiente. A exposição a altas concentrações de dióxido de enxofre pode ser perigosa ou mesmo mortal para os seres humanos.
Uma cópia da autorização de emergência para o despejo, vista pela Mongabay, também levanta questões sobre se o despejo no mar será a opção mais “ambiental, social e economicamente” adequada de acordo com as leis sul-africanas.
“Não vimos nenhuma evidência que nos convença de que a decisão de despejar no mar, em vez de lidar com ela a terra, seja preferível”, disse McDaid.
McDaid e outros ativistas estão a exigir maior transparência por parte da SAMSA e do Departamento de Silvicultura, Pesca e Meio Ambiente da África do Sul (DFFE), que emitiu a autorização de emergência em dezembro para prosseguir com a operação a 250 quilómetros (155 milhas) da cidade pesqueira de St. Helena Bay na costa atlântica do país.
Pelo menos metade da área está dentro de uma área crítica de biodiversidade identificada no recente Plano Nacional de Biodiversidade Espacial Costeira e Marinha, disse Stephen Holness, ecologista marinho da Universidade Nelson Mandela, à Mongabay.
Este trecho do Atlântico fica ao longo da rota de migração das tartarugas-de-couro ameaçadas (Dermochelys coriacea). As águas também abrigam tubarões brancos (Carcharodon carcharias) e sustentam o ameaçado albatroz-de-nariz-amarelo do Atlântico (Thalassarche chlororhynchos). Esta grande ave marinha alimenta-se de peixes, lulas e crustáceos.
Em novembro, a SAMSA garantiu ao público que a carga seria neutralizada antes de ser descartada em Vissershok, um aterro perto da Cidade do Cabo, na parte ocidental do país, que está equipado para lidar com resíduos de baixo a médio risco.
Mas o plano de bombear um gás inerte no porão do navio para cortar o abastecimento de oxigénio para a carga reativa falhou.
“Não havia outra alternativa, a não ser solicitar uma licença de despejo de emergência, pois estava claro que remover a carga reativa por contentores seria muito lento e era difícil extinguir o fogo”, disse Vernon Keller, vice-diretor de operações da SAMSA, à Mongabay.
Keller descreveu a decisão de despejar os produtos químicos no mar a uma profundidade de 3 km como um “último recurso”.
Os produtos químicos são armazenados em sacos, mas alguns estão danificados. “Uma escavadeira vai... pegar a carga e despejá-la no convés do navio. Em seguida, é despejado no mar, ou [a escavadeira] o despeja diretamente na água”, disse Keller a um canal de rádio sul-africano.
A SAMSA só divulgou uma lista de produtos químicos a bordo do NS Qingdao em 20 de janeiro, sob pressão após o anúncio de que sua carga seria despejada no mar.
Os 10 produtos químicos listados são: metabissulfito de sódio, nitrato de magnésio hexahidratado, magnesita calcinada cáustica, fosfato monoamônico, sulfato ferroso monohidratado, sulfato de zinco monohidratado, fosfato dicálcico, sulfito de sódio anidro, cloreto de cálcio e pasta de eletrodo.
Mas a autoridade não forneceu nenhuma informação sobre o que espera que aconteça com esse cocktail de produtos químicos quando estiver no oceano.
Pelo menos um dos materiais listados deve despertar preocupação. O sulfato ferroso monohidratado é amplamente utilizado em fertilizantes e ração animal e pode ser tóxico para a vida marinha, de acordo com a classificação de produtos químicos da ONU. A forma aquosa do produto químico também está listada no código International Maritime Dangerous Goods (IMDG).
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