14 de outubro de 2016

A alteração para combustíveis mais limpos: complicações, controvérsia e (alguma) confusão

A discussão sobre as emissões dos navios comerciais anda em volta do anexo VI da Convenção MARPOL, tendo ganho relevância após os recentes acordos globais de Paris sobre a redução e eliminação do aquecimento global. Incluída nestes acordos, está a exigência de que a quantidade de enxofre nos combustíveis marítimos seja reduzida a um nível fixo. A data de entrada em vigor tem de ser encontrada de forma realista, para poder proporcionar segurança jurídica e de investimento à indústria. No entanto, a política dos vários governos, reflectidas nas discussões no âmbito da Organização Marítima Internacional (IMO), tem sido tudo, menos uniformes ou, mesmo, coerentes.
A IMO terá, em breve, de definir um limite mundial de enxofre presente no combustível marítimo (0,5% a partir de 2020?). O Comité de Protecção do Meio Marinho da IMO estará reunido de 24 a 28 de Outubro para decidir a data de implementação do tecto de enxofre, se 2020 ou 2025. Actualmente, vigora um limite de 3,5% nas áreas de controlo de emissões (ECAs) no Norte da Europa e América do Norte. Existem, no entanto, questões controversas e não resolvidas: como seja a preocupação levantada por um estudo recente da OMI sobre a disponibilidade de combustíveis adequados para além de 2020, cujas conclusões poderão estar incorrectas (demasiado optimistas, segundo diversos analistas).
A BIMCO, a maior organização de armadores internacionais, argumenta que "não é possível determinar, a partir do estudo, se haverá combustível disponível suficiente para atender o limite de emissões após 2020. Nessa base, a opinião desta organização era que seria irresponsável a IMO optar por 2020, na próxima reunião. Sustenta, ainda, que deveria haver uma análise adicional que garantisse a cadeia de abastecimento, para que o comércio global não venha a ser gravemente perturbado e que as nações em desenvolvimento não sejam prejudicadas por falta de energia a preços acessíveis.
Outra alegação, apresentada pela associação de armadores contra 2020, é que o combustível para atender o limite de emissões de 0,5%, terá um ponto de inflamação mais baixo que o actual, podendo não ser seguro transportar nos tanques dos navios actualmente existentes.
A BIMCO alega, ainda, que a o novo limite de enxofre no combustível marítimo terá um significativo impacto nos custos. Isto porque os grandes centros de abastecimento, como Singapura ou Fujairah, serão capazes de fornecer óleo combustível com teores de enxofre entre os 0,5% até 3,5%, mas os portos menores e outros locais poderão não ter a infra-estrutura e capacidade de o poder garantir. Além disso, os navios que agora têm sistemas de purificação de gases de escape montados, podem encontrar dificuldades em continuar a obter combustível com teores de enxofre de 3,5%, já que as refinarias se dedicarão, em grande parte, à produção de óleo de até 0,5% de enxofre. São, assim, difíceis de encontrar compromissos de produção garantidos.
É provável que refinarias não modernizadas na Rússia, América Latina e noutros lugares continuem a produzir com alto teor de enxofre após 2020, sendo que, neste caso, os armadores de navios equipados com os depuradores poderão vir a ser beneficiados, apesar de infractores.
É claro que a União Europeia não está inclinada a esperar para além deste ano por uma decisão da IMO; é que a UE anunciou o alinhamento da sua regulamentação sobre o combustível marítimo com a da IMO, pelo que não vai esperar para além deste ano, muito menos se a data limite for adiada para depois de 2020. Nesse caso, as águas internacionais que se encontram dentro da Zona Económica Exclusiva Europeia (ZEEE), incluindo o Estreito de Gibraltar e os estreitos dinamarqueses, poderão ficar sujeitas a um limite imposto pela UE.
Fiscalizar o novo limite de enxofre no combustível, em alto mar, estará, em grande parte, dependente das autoridades do Estado de pavilhão e das suas organizações reconhecidas, principalmente sociedades de classificação. Tudo isto é questionável, especialmente quando se sabe da falta de uniformidade da aplicação escrupulosa dos regulamentos por parte dos Estados de bandeira ou pelos próprios registos.
Vigiar o cumprimento dos limites de emissão de enxofre será um desafio interessante para toda a comunidade internacional. Alguns métodos de detecção propostos, p. ex. à base de drones "sniffers", são soluções caras e sem aplicação em alto mar, sendo que os equipamentos de monitorização a bordo ainda não atingiram o nível de confiabilidade necessário, na opinião dos especialistas.
Os operadores não cumpridores correm, pelo menos no início, pequeno risco de serem apanhados, podendo, desta forma, poupar grandes somas se continuarem a queimar, de forma ilegal, combustível pesado. Mesmo que os violadores sejam apanhados, à semelhança das outras áreas de controlo de emissões existentes, os operadores podem enfrentar multas que nunca ultrapassam as economias que obtiveram pelo não cumprimento dos regulamentos.
A única "boa notícia" é que esta regulamentação pode muito bem provocar o aumento da demolição dos porta-contentores e outros tipos de navios, reduzindo assim o excesso da actual tonelagem.
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