Todos os anos, no dia 22 de abril, milhões de cidadãos em todo o mundo manifestam o seu compromisso na preservação do ambiente e da sustentabilidade da Terra. Neste dia de cariz educacional, pelas escolas de todo o mundo se escrevem frases e rabiscam desenhos, sobre a importância do planeta Terra.
A data foi criada em 1970 pelo senador norte-americano Gaylord Nelson, que resolveu realizar um protesto contra a poluição da Terra, depois de verificar as consequências do desastre petrolífero de Santa Barbara, na Califórnia, ocorrido em 1969.
51 anos depois, há um conjunto significativo de pessoas (algumas com responsabilidades de governação e, ou, com capacidade de influenciar) que prefere culpar o transporte marítimo por quase tudo o que de mal sucede ao ambiente. Dizem, esses especialistas, que “os navios são uma preocupação acrescida à escala mundial, porque o tráfego marítimo tem aumentado”. Esquecem-se, os mesmos, que no intervalo dos seus discursos estão na Internet a comprar... o que depois tem de ser transportado!
Mas, qual é o impacto ambiental de que falamos? Investigadores e associações ambientalistas alertam para o perigo e consequências do aquecimento global da Terra, nomeadamente:
- aumento da temperatura global da Terra;
- extinção de espécies animais;
- aumento do nível dos oceanos;
- escassez de água potável;
- maior número de catástrofes naturais, como tempestades, secas e ondas de calor.
No entanto – são cientistas que o afirmam – e se o carbono azul for a resposta mais concreta e efetiva que todos estamos à procura?
O que é carbono azul? Carbono azul é o termo para o carbono capturado pelos ecossistemas costeiros e oceânicos de todo o mundo. Os processos naturais de captura de carbono por animais marinhos e ecossistemas circundantes trabalham, constantemente e em conjunto, criando ciclos que garantem que o carbono seja, constantemente, absorvido e armazenado em organismos e sedimentos no fundo do oceano. Os ciclos do carbono azul são responsáveis pelo afundamento de quantidades significativas de carbono global nos oceanos. Em contrapartida, estes sistemas são, igualmente, os mais ameaçados.
Um, desses ecossistemas primordiais, é o pântano salgado, zona húmida costeira que sofre inundações diárias e vazantes de água salgada trazida pelas marés. Os pântanos salgados são incrivelmente eficazes na remoção de carbono da atmosfera e no armazenamento nos seus tecidos e, também, no solo.
Os sapais, por exemplo, encontram-se entre os sistemas mais produtivos do nosso planeta. Uma das suas características de maior relevo é a facilidade em reter e desativar matéria poluente, sendo considerados verdadeiros filtros de água dos meios onde se localizam, diminuindo, assim, os níveis de poluição do ambiente.
Exemplo concreto de um desses ecossistemas é o estuário do Tejo – o maior estuário da Europa Ocidental e um dos mais importantes da Costa Atlântica Europeia – cobrindo uma área de 32.500 ha, correspondendo as zonas entremarés (as que ficam emersas durante a maré baixa) a um pouco mais de 40% (13.600 ha) e que desempenham funções essenciais na manutenção, não só do seu próprio ecossistema como, ainda, na do litoral adjacente.
Figura 1: A zona central do estuário é ocupada pelo conhecido "Mar da Palha”, em cujas margens se situam as cidades de Almada e Lisboa.
Na orla do estuário existem diversos mouchões, esteiros, caniçais, morraceiras, salinas e lezírias com uma enorme riqueza biológica, que dependem da dinâmica das marés e da salinidade do estuário.
Muito embora e se calhar, toda a gente saiba, mas esqueça, existem muitos mais destes ecossistemas em Portugal – somos, aliás, um país riquíssimo neste capítulo. Sem ser exaustivo, lembro os mais conhecidos: Reserva Natural do Sapal de Castro Marim e Vila Real de Santo António, Parque da Reserva Natural da Ria Formosa, Reserva Natural do Estuário do Sado, Reserva Natural das Dunas de São Jacinto e o Sapal da Ria de Aveiro. Também no noroeste de Portugal temos os estuários dos rios Minho e Coura que, em conjunto, constituem uma zona húmida de elevado valor ecológico.
São áreas, porém, sujeitas a diversas ameaças. Ao longo da história, populações fixaram-se junto dos sapais pela proximidade de água, relevos suaves e abundância de alimento e matéria-prima. Com o prosperar destes agregados, as localidades expandiram-se e, gradualmente, foram exercendo pressão sobre os sapais, ocupando-os e convertendo essas zonas em terrenos agrícolas e de construção de habitação, para além de unidades hoteleiras e, pior, campos de golfe.
Pela sua fragilidade, os sapais são dos ecossistemas mais ameaçados do mundo, em consequência das pressões antropológicas neles exercidas.
Ervas marinhas, caniçais, mouchões, morraceiras e pântanos salgados ao longo de nossa costa "capturam e retêm" carbono, agindo como algo chamado sumidouro de carbono. Estes sistemas costeiros, embora muito menores em tamanho do que as florestas do planeta, sequestram o carbono, a um ritmo muito mais rápido e podem continuar a fazê-lo por milhões de anos. A maior parte do carbono absorvido por eles é armazenado abaixo do solo, onde não o podemos ver, mas que lá está retido. O carbono encontrado no solo costeiro costuma ter milhares de anos!
As Áreas Protegidas, tal como as demais áreas classificadas, sofrem de um historial, já longo, de múltiplos défices: de recursos humanos e financeiros, de fiscalização, de ações de conservação da natureza e restauro ecológico de habitats. E não têm merecido a atenção devida do poder político, dos media e da opinião pública. Pântanos salgados e florestas de ervas marinhas não são tão abundantes quanto antes, ameaçados com as indústrias a abrir esses espaços para resorts e pisciculturas.
Figura 2: A Reserva Natural do Sapal de Castro Marim e Vila Real de Santo António, zona húmida de importância internacional, foi a primeira reserva natural a ser criada em Portugal em 1975, sendo uma das mais importantes zonas húmidas do país.Acho que posso falar por todos nós, quando digo que a crise climática nos deixa, claramente, tristes e preocupados. Mas, e se o azul for (tão só!) a resposta que todos estamos à procura? Continuaremos a culpar os navios e a ocupar o sapal?
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