Foi com alguma admiração que
muitos portugueses ficaram a saber do início de exportação de carne suína para
a República da China. Mas, então – perguntarão os mais incrédulos – não são
eles que exportam tudo e para todos?
Pelo porto de Sines passou,
esta quarta-feira, dia 6/2, a primeira exportação de carne de porco para a
China, proveniente de três matadouros portugueses, num negócio que deverá movimentar
100 milhões de euros, só durante o presente ano. As 270 toneladas de carne de
suíno, no valor de 1 milhão de euros, vão carregadas em dez contentores, que
serão transportados via marítima para a província chinesa de Hunan.
Para a concretização da operação serão abatidos e transformados “cerca
de dez mil animais por semana”, refere a Federação Portuguesa de Associações de
Suinicultores. E os números irão duplicar em 2020!
A alteração da dieta alimentar
na China: carne e lacticínios em ascensão
O aumento rápido do rendimento
na China levou a uma alteração na dieta alimentar e ao aumento da procura por
carne, lacticínios e alimentos processados. A China dispõe de cerca de 12% da
terra arável do mundo, mas tem de alimentar quase 19% da população global. As
novas tecnologias e a reforma agrária apenas podem oferecer uma solução
parcial, já que os agricultores e as camadas mais jovens preferem trabalhar nas
cidades, deixando uma população rural envelhecida a trabalhar a terra, cada vez
mais contaminada pela indústria.
Exemplo disso, é que cerca
de 60% da soja comercializada em todo o mundo é comprada pela China, com mais de
metade das importações originárias do Brasil.
Na verdade, actualmente, na China
come-se de forma diferente e isso reveste-se de importância vital – e com impacto
global! O tamanho e o crescimento da China significam que mesmo pequenas
mudanças nos padrões de dieta e estilo de vida têm grandes impactos em termos
de saúde pública, segurança alimentar e meio ambiente.
Os actuais padrões de crescimento e consumo da China causam imensas
implicações para o clima global e outras preocupações ambientais, incluindo a
água, a terra usada para produzir alimentos, as emissões de carbono e o uso de
combustíveis fósseis. Estima-se que a China seja responsável por um décimo de
todos os gases de efeito estufa e aerossóis lançados na atmosfera durante a era
industrial.
A transição nutricional da
China tem sido e continua a ser rápida e substancial, particularmente no que
diz respeito ao consumo de produtos animais. Até o final da década de 1980, as
famílias contavam com recursos locais para produzir alimentos – criações rurais
e domésticas de carne suína que dependiam de forragem e restos de comida para
alimentação. Desde então, a mudança para empresas agrícolas especializadas e fábricas
de ração comerciais têm alimentado (e projectado) a economia do país.
Com o aumento dos salários
dos trabalhadores rurais e problemas ligados às doenças animais, aumentou a
pressão para passar da agricultura rural para a agricultura/pecuária industrial
e de larga escala. A urbanização e a melhoria dos padrões de vida também
desempenharam um grande papel, prevendo-se que 63% da população possa estar a viver
em áreas urbanas até 2023. A melhoria do rendimento sustenta a crescente procura
e o valor da carne.
A tendência de consumo de lacticínios
na China também não pode ser ignorada. No passado, os produtos lácteos eram uma
parte muito insignificante da dieta chinesa. Com a mudança para as dietas
ocidentais, as pessoas estão a consumir quantidades, notavelmente, maiores de
leite, iogurtes e sorvetes – e até mesmo queijo, em restaurantes de fast-food (cheeseburgers!).
Estas mudanças na dieta na China, como atrás se diz, são sentidas em
todo o mundo, tanto ambientalmente, como economicamente. A China precisa
alimentar 20% da população mundial e consome metade da carne suína do mundo.
Criar mais suínos, de longe, a carne de eleição na China, significa produzir mais
alimentos no mercado interno e importar rações de outros países – ambas actividades
com uma pegada de carbono significativa. Além da carne de porco, o consumo de
ovos, aves e lacticínios continua a crescer.
E como planeia a China alimentar
1.400 milhões de bocas, cada vez com mais apetite? Os chineses comem quase três
vezes mais carne do que em 1990. O consumo de leite e lacticínios quadruplicou,
de 1995 a 2010.
A China está a enfrentar um
desafio colossal: como alimentar quase um quinto da população mundial com menos
de dois décimos do solo arável do mundo, enquanto se adapta às mudanças dos
gostos e dieta dos seus cidadãos. Há trinta anos, menos de um quarto da
população vivia em cidades; em 2016, 57% da população era urbana, que habita
uma China mais rica e tecnologicamente avançada, com uma dieta cada vez mais
parecida com a do Ocidente.
À medida que mais chineses procuram
dietas de estilo ocidental, o país em expansão corre para industrializar uma
economia agrícola construída sobre uma economia de subsistência, composta por
pequenas fazendas.
Mais de 90% de todas as parcelas agrícolas na China têm menos de 2,5
acres (200m x 20 m) e o tamanho médio delas está entre os menores do mundo. Mas
não só. Nas últimas quatro décadas, a China conseguiu o desenvolvimento
agrícola que demorou 150 anos ao mundo ocidental. Houve como que uma revolução:
de minúsculas courelas familiares passaram para fazendas de alta tecnologia sustentável
- com produção directa a fábricas de carne industriais e lacticínios de alta
qualidade – ou, até mesmo, a quintas orgânicas urbanas.
Sendo os recursos agrícolas
da China tão limitados, o fornecimento dessa nova dieta significa importação, ao
mesmo tempo que o governo incentiva – e ajuda – empresas chinesas a adquirir
terras e empresas alimentares no exterior, como Estados Unidos, Ucrânia,
Tanzânia e Chile.
Como atrás se refere, a
China sempre valorizou a carne de porco na sua dieta, e os suínos eram
tradicionalmente criados – e abatidos – em pequenos lotes. Em 2015, menos de
três quartos dos porcos consumidos na China eram produzidos nas unidades
pecuárias chinesas. É por isso: com um apetite crescente, o porco português
representa uma resposta conveniente e válida à escassez do país mais populoso
do mundo.
Fonte: imprensa diária e National Geographic
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