12 de maio de 2020

Combustíveis mais baratos mudam as rotas marítimas


Primeiro foram as linhas contentorizadas. Agora os operadores de crude. Tem sido pesado o impacto do Covid-19 na procura por bancas por parte do transporte marítimo, seja pelo cancelamento de viagens de linha, por lay-up de navios (retirados de serviço), quer por os navios estarem a ser usados ​​como armazenamento flutuante. Os proprietários de navios, apreensivos e a desesperarem com os preços que as bancas compatíveis atingiram em janeiro, agora podem consumi-lo a um quarto do preço.
Na verdade, com os preços dos combustíveis em níveis extremamente baixos e os custos de passagem no Canal de Suez a manterem, vários operadores de contentores optaram por mudar seus navios para rotas em torno do Cabo da Boa Esperança. Segundo a Bloomberg, alguns operadores de navios-tanque estão, agora, a fazer o mesmo.
Segundo a Bloomberg, quando o VLCC New Vigorous chegou ao porto de Antifer, no norte da França, no início de maio, fez um pouco da história marítima. O navio, carregado com 2 milhões de barris de petróleo, tornou-se o primeiro, em quase dois anos, a fazer a viagem da Arábia Saudita ao noroeste da Europa passando o Cabo da Boa Esperança, na África do Sul – uma viagem que leva quase o dobro do tempo da rota usual, passando pelo canal de Suez. Neste momento, pelo menos outros dois VLCCs estão a fazer o mesmo.
"Por todo o mundo se tenta adiar a entrega de cargas", disse Peter Sand, analista-chefe de transporte marítimo da BIMCO. "Neste momento, com esta situação de preços muito baixos de combustível, faz sentido fazer passar navios pelo o Cabo da Boa Esperança."
Duas semanas após o New Vigorous zarpar para a França, outro navio-tanque, o New Harmony, partiu na mesma rota pelo sul de África, segundo dados de rastreamento de navios, compilados pela Bloomberg. Duas semanas depois, um terceiro navio, o New Pioneer, fez o mesmo.
Existem outros casos esporádicos de viagens de longa distância. Por norma, os petroleiros oriundos da Europa não navegam pela ponta da América do Sul; no entanto, no mês passado, o Psara I fez exactamente isso para entregar o primeiro petróleo norueguês na costa oeste dos EUA em 11 anos. Também o Trident Liberty se constitui como o primeiro VLCC a carregar petróleo curdo em Ceyhan, na costa mediterrânea da Turquia, e transportá-lo, provavelmente para a China, circundando a costa de África. Cargas para a China deslocam-se, normalmente, em navios mais pequenos, através do Canal de Suez.
Na verdade, a utilização de rotas mais longas representa um aumento significativo na distância e no tempo da viagem; porém, limita a oferta de tonelagem num mercado saturado e em colapso.
Os VLCCs têm demasiado calado para passarem pelo Canal de Suez em carga completa, pelo que eles descarregam, em geral, num terminal de oleoduto próximo ao final da hidrovia do Mar Vermelho e recarregam quando chegam ao Mediterrâneo. Para uma viagem do Golfo Pérsico ao noroeste da Europa, a viagem dura um pouco mais de três semanas.
Com os custos de combustível tão baixos, fica mais barato evitar o canal – onde as “portagens” podem chegar a centenas de milhares de dólares – mesmo ficando a viagem mais longa. Nas últimas semanas, o canal aumentou temporariamente os descontos concedidos a alguns navios, embora não a petroleiros.
Mas nem tudo “são rosas” no aproveitamento destes condicionantes de mercado que vão surgindo. De tudo isto ressalta uma maior preocupação com as considerações ambientais e de os armadores, sobreendividados, tentarem retardar o compromisso do sector de transporte marítimo de cumprir as metas de redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE). Ou seja, teme-se que as pressões financeiras sobre as transportadoras possam superar as considerações ambientais.
Este receio foi assumido por um grupo de organizações não-governamentais (ONGs) – que inclui a Greenpeace, entre outras – que o objectivo da IMO de alcançar uma redução substancial de CO2 pelo transporte marítimo internacional antes de 2023 deve permanecer inalterado.

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