O P&I The Swedish Club
publicou uma nota de recomendação aos seus associados seguros chamando a
atenção para o facto de que a recente vaga de afretamento de navios petroleiros
para servirem de depósito envolve situações, muitas vezes complicadas, mas não
totalmente salvaguardas nas cartas de partida.
O mercado de petróleo sofreu
uma queda dramática nos preços devido ao excesso de oferta e à queda
substancial na procura devido, entre outras coisas, ao Covid-19. O descalabro
do mercado ficou à vista quando o preço do petróleo caiu, temporariamente,
abaixo de zero, o que significou que, em princípio, os vendedores teriam de
pagar aos compradores para se livrarem do óleo. Daí resultou o facto dos traders terem procurado armazenar o
petróleo por várias semanas ou meses, antecipando (ou esperando) uma
recuperação no preço do petróleo (cotango).
Mas, devido à pouca procura
pelo produto e à escassez de disponibilidade de armazenamento em terra, levaram
os comerciantes a procurar outro lugar. A opção foi fretar mega petroleiros de
petróleo bruto (VLCCs) e ultra grandes (ULCCs) usá-los como armazenamento
flutuante no mar. Embora essa possa ser uma opção atraente, os proprietários e
os afretadores devem estar cientes de que o uso de navios como armazenamento
flutuante tem implicações tanto operacionais, como legais.
Os navios fornecem uma opção
muito mais móvel e flexível de armazenamento. Podem ser instruídos a prosseguir
para, ou esperar em, quase qualquer lugar e, uma vez recuperado o mercado,
podem prosseguir para um porto de descarga e entregar a carga a um comprador.
Também podem haver implicações alfandegárias e tributárias significativas para
o armazenamento de carga.
A maioria das empresas de
fretamento está dedicada para o transporte de carga de um lugar para outro, e
não para o armazenamento. Estas empresas foram desenvolvidas e estão preparadas
para lidar com riscos conhecidos ou previstos e alocá-los entre fretadores e proprietários.
Ao alterar o uso pretendido dos navios, as partes precisam planear e lidar com
os problemas que possam daí decorrer.
Em geral, as afretadoras por
viagem pretendem transportar a carga de um lugar para outro o mais rápido
possível, Não estão preparadas para atenderem um navio carregado, sob contrato
de afretamento, fundeado num qualquer local por várias semanas ou meses. Os
proprietários cobram o frete por uma viagem, e não pelo tempo – embora existam
multas e incentivos por demoras ou avanços das operações de carga, nas formas conhecidas
de demurrage e despatch. É do maior interesse dos proprietários concluir a viagem
o mais rápido possível, para que possam realizar o próximo evento. Questões
como manutenção e docagem a seco são, em geral, realizadas pelos proprietários entre
viagens – mas isso pode não ser possível se o navio for afretado por vários
meses.
Alguns contratos de afretamento
de viagem incorporaram termos que permitem que o afretador opte por solicitar
que o navio aguarde por ordem – transformando, desta forma, o navio em tancagem
de armazenamento. A carta-partida, por regra, fornecerá uma taxa de demurrage substancialmente mais elevada
se o navio for usado para armazenamento. Nessas circunstâncias, os
proprietários podem ficar satisfeitos por os afretadores instruírem o navio a
esperar, pois sabem que serão bem compensados pelo tempo perdido. No entanto,
para a afretadora (e todas as partes envolvidas) deve ser absolutamente claro qual
o regime de demurrage a aplicar. Por
exemplo, no caso concreto do NT Zaliv Baikal, a carta-partida dispunha que, se
os afretadores ordenassem que a embarcação parasse e esperasse por novas ordens,
seria aplicada uma taxa de demurrage
significativamente mais. Depois de recebido o aviso de pronto, os afretadores
não deram ordens e o navio ficou fundeado por vários (64) dias. Os
proprietários reivindicaram a taxa mais elevada de demurrage, enquanto os afretadores pretendiam pagar apenas a taxa
padrão. O tribunal considerou que o ressarcimento era pagável à taxa normal da
parte afretadora e não às taxas crescentes estabelecidas nas cláusulas
adicionais. Isso porque não existiram instruções expressas para que o navio ficasse
parado a aguardar outras ordens.
Os fretamentos a tempo estão
mais dedicados para o uso como armazenamento, porque os fretadores fretam a
embarcação por um período determinado e geralmente são livres para ordenar que o
navio siga para qualquer destino ou aguarde, apenas sujeito às limitações
comerciais ou de carga acordadas. Por vezes, as companhias afretadoras
estabelecem, expressamente, que um navio pode ser usado para armazenamento, mas
muitas das vezes essa é uma cláusula avulsa e descartável, incluída sem muita
reflexão sobre as implicações do uso do navio num armazenamento a longo prazo.
Há considerações práticas
que precisam ser levadas em consideração: quanto tempo e onde a embarcação irá
aguardar?
Os afretadores precisarão antecipar
por quanto tempo irão afretar o navio. Se o período estabelecido na carta-partida
for muito curto, os proprietários poderão recusar-se a estendê-la e o preço do
petróleo poderá não ter sido recuperado o suficiente. A taxa de afretamento
para navios-tanque capazes de serem usados como armazenamento flutuante
aumentou, rapidamente, devido ao aumento da procura. O preço do petróleo
precisa aumentar o suficiente para compensar o custo do afretamento, caso
contrário os afretadores não obterão nenhum benefício. Pelo contrário, se os
afretadores tomam o navio por muito tempo, podem ficar presos a um navio de que
não precisam mais, pagando uma taxa muito elevada. Os afretadores procuram
flexibilidade, enquanto os proprietários procuram uma taxa de contratação
favorável por mais tempo. No caso de contratos existentes, os afretadores podem
pretender estendê-las às taxas mais antigas, enquanto os proprietários procuram
rescindir para fechar fretamentos mais lucrativos.
A maioria dos navios não foi
projectada para ficar no mesmo local por muito tempo. Quando se prolonga a
estadia num lugar, provavelmente, o navio experimentará incrustações e
crescimento de algas marinhas no casco, o que pode exigir manutenção contínua e
que o obrigue a ser docado no final do contrato. Quem pagará a conta?
O armazenamento a longo
prazo também pode estar sujeito a preocupações de ordem regulatória, de
manutenção e segurança. As sanções internacionais aplicáveis a determinados
países ou entidades podem mudar ao longo do tempo. Alguns países podem
restringir ou proibir um VLCC ou ULCC, totalmente carregado, de estar fundeado
nas suas águas territoriais por vários meses. Um armazenamento flutuante de
longo prazo pode estar sujeito a condições climáticas adicionais, pirataria e
riscos políticos. À luz do coronavírus, alguns portos impuseram severas
restrições a mão-de-obra, ao fornecimento de navios e ao embarque ou
desembarque de tripulantes. Se um membro da tripulação ficar doente ou não
puder ou não estiver disposto a trabalhar, e os proprietários não puderem
colocar uma nova tripulação a bordo, um navio poderá não cumprir os requisitos
de tripulação segura, fazendo-o perder a navegabilidade.
Afretadores e proprietários
também devem estar cientes de possíveis problemas com a carga – os proprietários
são obrigados a fornecer um navio em condições de navegar, incluindo a
capacidade de armazenar e transportar carga com segurança. O navio deve ser
capaz de garantir que a carga seja mantida e monitorizada por vários meses para
garantir que a mesma não seja danificada.
Os afretadores,
proprietários de navios e proprietários das cargas devem garantir haver um
seguro de carga, P&I, responsabilização adequada do afretador e o estabelecimento
de quem arcará com o custo de quaisquer prémios adicionais. As partes
precisarão notificar as suas seguradoras ou corretoras, reavaliar a cobertura
existente e estabelecer se e qual o seguro adicional precisam. Por exemplo, os
proprietários de carga precisam estar cientes de que as cláusulas da ICC (que
são as cláusulas padrão de seguro de carga marítima) não foram projectadas para
o armazenamento de óleo a longo prazo. Os proprietários e afretadores de navios
precisam considerar se aumentaram a sua exposição à responsabilidade por
poluição ou danos à carga.
A opção de fretar
embarcações para armazenamento flutuante pode ser muito atraente para
proprietários e afretadores, mas as partes devem garantir que calcularam e
planearam os riscos associados a tudo isso.
Explore melhor o documento com as implicações legais publicado pelo: The Swedish Club.
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