No mês de agosto, em resultado de erros de navegação,
sucederam demasiados acidentes com navios. Numa era de incontáveis ajudas
electrónicas à navegação a bordo dos navios e da obrigatoriedade de formação
específica das tripulações, em sede de simulação, parece inconcebível a
sucessão de tanto acidente. Em simultâneo, assiste-se ao crescimento das
dimensões dos navios, em especial os de carga contentorizada, que não vêm para
substituir outros menores, mas para tomar o seu lugar em determinadas linhas
comerciais, sendo os menores utilizados noutras linhas e portos. Ou seja, mais e
maiores navios que navegam nas mesmas rotas marítimas, no mesmo espaço (marítimo
e fluvial), criando situações críticas de congestionamento de tráfego em alguns
pontos do globo e, até, de restrições críticas de espaço de manobra. O oceano pode ser enorme e as tecnologias de navegação podem
ser avançadas, mas estão reunidas as condições para o surgimento de cada vez
mais acidentes e colisões entre navios. Mas vamos por partes: comecemos por 3
exemplos elucidativos.
- A 14 de Agosto: o mega porta-contentores “CSCL Jupiter” encalhou num banco do rio Escalda, em Bath, Zeeland, na Holanda, quando navegava de Antuérpia para Hamburgo, a cerca de 13 nós, após falha de governo. O trânsito de e para Antuérpia, o segundo maior porto da Europa, ficou interrompido depois que o gigante de 366 metros e 14.300 TEU encalhou (https://www.porttechnology.org/news/antwerp_port_blocked_as_cargo_ship_runs_aground).
- A 21 de Agosto: um petroleiro carregado com 12 mil toneladas de petróleo colidiu com o cruzador da Marinha dos Estados Unidos “USS John S McCain”, provocando a morte de 10 tripulantes e ferimentos em vários outros. Este foi o quarto incidente com a 7ª esquadra dos EUA, só este ano, que se encontra em manobras no Pacífico, tendo levado à demissão do comandante dessa esquadra (https://maritimecyprus.com/2017/08/25/why-do-u-s-navy-ships-keep-crashing/).
- A 29 de Agosto: o graneleiro “Star of Sawara” encalhou na ponta sul de Falster, a 15 quilómetros a sueste da costa. O navio estava em rota de Ust-Luga para Nova Orleães com uma carga de fertilizantes. O navio terá iniciado uma alteração de rumo demasiado cedo, quando navegava no esquema de separação de tráfego no Fehmern Belt, entrando na zona de separação, que não dispõe de águas profundas. O navio não tinha piloto a bordo (http://mfame.guru/navigational-mistake-grounds-ship-off-falster/).
Os
navios envolvidos nestes incidentes recentes são grandes e bem equipados com
sistemas (redundantes) de radar e navegação. Há, também, rastreamento GPS,
sistemas de identificação automática (AIS) e comunicações de rádio. Como poderam
acontecer estes acidentes? E o que pode ser feito para evitar que aconteçam de
novo?
Quando
ocorrem estes acidentes, os investigadores descobrem que o erro humano foi a
causa final na grande maioria, segundo um especialista da empresa dinamarquesa
Survey Association.
Os
mares são cada vez mais navegados e o número global de navios comerciais
continua a crescer. De acordo com o governo do Reino Unido, havia cerca de 58
mil navios na frota comercial mundial no final de 2016. O tamanho da frota, se
medido em tonelagem de arqueação, doplicou desde 2004.
Então,
as colisões tornar-se-ão mais frequentes?
O
mesmo especialista sugere que, desde a crise financeira de 2008, muitas
companhias de navegação enfrentaram margens mais apertadas e podem ter
subavaliado as necessidades de tripulação (em quantidade e qualidade) em
resultado disso.
E em
qualquer navio grande, uma tripulação típica compreende, em geral, uma mistura
de diferentes idiomas, nacionalidades e culturas de segurança, tornando o trabalho
de manter o navio seguro mais complicado.
Uma
preocupação crescente é a confiança exagerada dos marinheiros modernos na
tecnologia, diz o antigo oficial Aron Soerensen, director de tecnologia e
regulamentação marítima no Baltic and International Maritime Council (Bimco).
“Em
vez de se olhar para os instrumentos, tem que se olhar pela janela para ver
como evolui, na realidade, a situação”, disse ele. “Talvez hoje exista um pouco
de exagero na fixação nos instrumentos”.
De
acordo com dados da seguradora Allianz, houve 85 perdas totais de grandes
navios registadas em 2016, menos 16% em relação ao ano anterior. De todos os
85, apenas uma perda total foi em resultado de uma colisão.
Não
há dúvida de que a tecnologia contribuiu de diversas formas para a segurança no
sector de navegação – mas a vida como marinheiro continua a ser perigosa. À
medida que mais e mais, cada vez maiores navios navegam os mares do mundo, a
necessidade de comando desses gigantes não desapareceu, antes, tornou-se cada
vez mais premente.
Embora se não conheçam os detalhes destes últimos
acidentes, muitas das vezes é deixado aos instrumentos o ónus de aviso da
colisão iminente, ao invés dos membros da tripulação fazerem o controlo da
navegação. Ao cego, a bengala não lhe dá visão, apenas o ajuda a antecipar
obstáculos! E mesmo assim…
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