A Assembleia Municipal de
Lisboa aprovou ontem, dia 3 de Março, recomendações do BE e do PAN que visam
tomar medidas para reduzir a poluição causada pelos navios de cruzeiro na
capital. Assim rezam as parangonas de jornais portugueses. Mas quem são esses
senhores que se arrogam ao direito de “legislar” sobre o que não têm mandato e
que é uma fonte contributiva extraordinária para pagar muitos dos desvarios que
pela capital se vão fazendo? Eles são aos milhares de passageiros por navio que
pagam “portagem” por visitarem Lisboa, às autoridades municipais!
E mais do mesmo: VAMOS
PROIBIR! Proíbem-se os navios “que não tenham transitado para energias mais
limpas e sustentáveis”? Que raio é isso? Que navios são esses? A OMI já os
classificou? Limitação da atracação de navios de cruzeiro com 1.000 toneladas?
Para estes “meninos” mil toneladas devem ser muita coisa… Parecem querer matar “a
galinha dos ovos de ouro”.
Na verdade, os portos poderão
ter um importante papel na redução das emissões de navios, agora que o sector
de transporte marítimo está a entrar num novo período ecológico, procurando formas
de reduzir as emissões dos seus navios. No entanto, para além de poderem
premiar armadores que tragam navios movidos a combustíveis menos poluentes, os
portos devem caminhar de forma mais proactiva, adicionar outra solução: o
fornecimento de energia eléctrica.
Como funciona o sistema de
energia externa ao navio?
Não traz qualquer novidade.
Todos já conhecem o sistema que carrega o automóvel eléctrico (híbrido, no caso
dos navios por utilizarem outro combustível para a sua propulsão). Os aviões
também o fazem, ou alguém se lembra de alguma vez ter embarcado com as turbinas
em funcionamento? No entanto a cabina está sempre iluminada e existe circulação
de ar!
Actualmente, quando os
navios estão atracados, usam os seus motores auxiliares para suportar algumas
funções básicas. Isso deve ser levado em consideração, pois gera descarga de
SOx, NOx, CO2 e partículas, além de ruído e vibração.
Para atenuar esses
problemas, o fornecimento de energia de terra oferece uma solução. Essa
tecnologia é basicamente uma medida antipoluição, para reduzir a poluição do ar
produzida por geradores a diesel,
através do uso de energia eléctrica de terra. O nome técnico desta operação
simples é o “Cold Ironing”.
Por outras palavras, o “Cold Ironing”, ou conexão a terra,
energia terra-a-navio (SSP) ou energia marítima alternativa (AMP) é o processo
de fornecer energia eléctrica ao costado do navio atracado enquanto os motores auxiliares
e principal estão desligados. Este abastecimento de fonte externa permite que
equipamentos de emergência, refrigeração e aquecimento, iluminação e outros
equipamentos recebam energia eléctrica, de forma contínua, enquanto o navio
carrega ou descarrega a sua carga. Cabe aqui dizer que não seão, apenas, os navios
de cruzeiro os únicos potenciais “clientes”, mas todos os navios que para isso
estejam preparados.
“Shorepower” é o termo geral para descrever o fornecimento de
energia eléctrica a navios, pequenas embarcações, aeronaves e veículos
rodoviários enquanto estacionados. Durante o shorepower, o navio desliga os seus motores enquanto atracado e fica
ligado a uma fonte de energia em terra, sem interromper os serviços a bordo.
Tecnologia necessária
Apesar dos seus inegáveis
benefícios ambientais, o shorepower
é um sistema tecnológico complexo, composto por vários elementos:
- Infraestrutura eléctrica necessária nos portos, com sistemas projectados e integrados, que devem atender a todos os tipos que visitam os portos;
- Infraestrutura eléctrica dos navios, por conversão (retrofit) ou de origem;
- Soluções de conexão e controlo que garantam a segurança do pessoal e a transferência contínua de energia;
Todos estes factores podem
criar algumas barreiras na implementação da tecnologia.
Benefícios
Na verdade, vários estudos por
todo o mundo, descobriram que na utilização deste método são gerados muitos
benefícios ambientais e sociais.
O shorepower traz, essencialmente, benefícios sociais e ambientais. De
facto, se a tecnologia for correctamente implementada, poderá melhorar, muito significativamente,
a qualidade do ar, reduzindo as emissões de CO2 em mais de 30% e mais de 95% de
NOx e particulados, apenas pelo facto dos auxiliares do navio estarem parados.
Como relatado em alguns dos estudos, em 10 horas de escala de um navio de
cruzeiro, as suas emissões diminuem de 72,2 para 50,1 toneladas de CO2, de 1,47
para 0,04 toneladas de óxido de nitrogénio e de 1,23 para 0,04 toneladas de
óxido de enxofre.
Mas os benefícios não se ficam
pelas emissões, podendo nós acrescentar:
- Reduz a poluição sonora;
- Oferece melhor conforto a
bordo enquanto em porto;
- Fornece perfil verde aos armadores e passageiros;
- Reduz o custo do ciclo de vida em menos consumo de combustível e custo de manutenções.
Desafios
O custo total de capital necessário
à instalação da tecnologia em portos de tamanho médio como o de Lisboa poderá
atingir a meia dezenas de milhões de euros, pelo que o retorno do capital investido
e a cobertura dos custos operacionais do sistema demorariam “meia dúzia de anos”.
A não ser se subsidiados pela UE.
Julgo eu, que se encontram
em execução projectos, no âmbito do Programa TRIMIS da Comissão Europeia, que
se destinam à electrificação dos portos do sul da Europa (https://trimis.ec.europa.eu/project/electrification-eastern-mediterranean-area-use-cold-ironing-and-electricity-propulsion).
A Comissão de Transportes do
Parlamento Europeu apoiou em Setembro de 2018 a remoção de barreiras fiscais ao
fornecimento de electricidade do lado terrestre (alternative marine power ou “cold
ironing”), a navios atracados em portos.
Apesar dos desafios que
podem surgir com a instalação de sistemas de shorepower, são muitos os portos (por todo o mundo) que já
implementaram esta solução com êxito. A Bélgica, a Noruega e a Holanda já
avançaram para esta solução, principalmente para os seus cais destinados a
ferries.
Atenda-se ao quadro abaixo.
Data de Introdução
|
Porto
|
País
|
Data de Introdução
|
Porto
|
País
|
2000
|
Gotemburgo
|
Suécia
|
2013
|
San Francisco
|
EUA
|
2000
|
Zeebrugge
|
Bélgica
|
2013
|
Halifax, Vancouver
|
Canadá
|
2001
|
Juneau
|
EUA
|
2015
|
San Diego
|
EUA
|
2004
|
Los Angeles
|
EUA
|
2017
|
Helsínquia
|
Finlândia
|
2005
|
Seattle
|
EUA
|
2018
|
Estocolmo
|
Suécia
|
2010
|
Verko, Karlskrona
|
Suécia
|
2018
|
Kristiansand
|
Noruega
|
2010
|
Amesterdão
|
Holanda
|
2019
|
Dunquerque
|
França
|
2011
|
Long Beach
|
EUA
|
2020
|
Hamburgo
|
Alemanha
|
2011
|
Oslo
|
Noruega
|
2020
|
Nova Iorque
|
EUA
|
2011
|
Prince Rupert
|
Canadá
|
No ano de 2019, as
autoridades chinesas informaram ter iniciado estudos conducentes à implementação
de estruturas de fornecimento externo de energia eléctrica a navios em 6 dos
seus portos. Este é um processo que ninguém vai parar.
A actividade marítima é o
reflexo do comércio mundial, responsável pelo transporte de 90% do produto
manufacturado e de 70% da matéria-prima produzidos a nível global. No que
respeita o turismo de cruzeiro, para além de ter transportado 32 milhões de
passageiros a nível mundial no ano de 2019, sendo que o sector gerou 160 mil
milhões de dólares, um terço deles em vencimentos e outras remunerações a perto
de milhão e meio de trabalhadores directos.
É por estas razões que
estes comportamentos políticos desproporcionados (ou, até, naïfs) não são justificáveis. Podemos e devemos diminuir os efeitos
negativos provocados no ambiente pela actividade marítima, mas temos de o fazer
de forma evoluída, com contributos positivos. A expressão Portugal é um País de
tradição (vocação) marítima não pode, nem deve, ser, a tradução de um discurso
vazio e populista!Notícia no DN
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