Na terça-feira, o presidente Obama anunciou que colocava, "indefinidamente",
quase um milhão de km2 de águas federais, tanto no Árctico como no Oceano
Atlântico, fora dos limites para futura prospecção de petróleo e gás.
Os grupos ambientalistas vinham a pedir, precisamente, esta decisão
desde as eleições – como forma de antecipação a Donald Trump. O que é
interessante aqui realçar é que, embora Obama possa, legalmente, pôr essas
áreas fora dos limites por ordem executiva, não é claro que Trump possa,
unilateralmente, reverter esta disposição, pelo menos sem o Congresso aprovar
uma nova lei. A disputa depende de uma secção pouco clara de uma lei de 1953, a
Lei de Terras da Plataforma Continental Exterior, que nunca foi dirimida nos
tribunais.
Primeiro, vamos olhar para as terras em questão. A Casa
Branca colocou meio milhão de km2 de águas federais ao norte do Alasca, nos
mares de Chukchi e Beaufort, fora dos limites de futura exploração de petróleo
e gás. (Uma secção menor do mar de Beaufort, perto da costa, continuará
disponível para futuro arrendamento).
A Shell já tinha, anteriormente, tentado procurar crude
nesta região gelada e traiçoeira – mas acabou por desistir em Setembro passado,
depois de insucessos sucessivos da prospecção, combinados com os preços baixos
do petróleo – mas o projecto tornou-se demasiado arriscado e caro. A Shell lutou
com gelo flutuante e o clima severo da região durante anos.
Obama procedeu de igual forma com 20 mil de km2 do Oceano
Atlântico norte. Anteriormente, durante o seu mandato, o seu departamento do
interior tinha ponderado concessionar algumas dessas áreas mais a sul, no Atlântico
médio. No entanto, ele acabou por reverter, mais tarde, essa possibilidade, depois
das comunidades costeiras da Virgínia e Carolina do Norte terem protestado a
preocupação com os efeitos de potenciais derrames no turismo.
Então, como conseguiu Obama fazer isto? Simples. A Secção 12
(a) da Lei das Terras da Plataforma Continental Exterior diz: "O Presidente
dos Estados Unidos pode, de vez em quando, retirar a disponibilidade de quaisquer
das terras não libertas da Plataforma Continental Externa". E foi o que
Obama fez: retirou a disponibilidade dessas áreas, tal como previsto na
disposição legal. A plataforma continental externa inclui o fundo submerso do
mar, entre o continente dos EUA e o oceano profundo. As companhias têm vindo,
até agora, a perfurar no golfo do México.
No entanto, a questão mais entranha desta lei de 1953 é que
ela não estabelece que um futuro presidente possa vir a desfazer uma retirada
permanente como esta. Segundo dois grupos ambientalistas explicam, o Natural
Resources Defense Council e o EarthJustice, a reversão implica que apenas o
Congresso pode voltar a colocar essas áreas em disponibilidade para concessão
de petróleo e gás.
Não está, assim, claro o que irá acontecer a seguir. Nenhum
presidente jamais tentou reverter uma retirada permanente feita sob a seção 12
(a). Mas Trump prometeu abrir novas áreas federais para perfuração de petróleo
e gás, quando presidente, sendo que a indústria petrolífera já está a
pressioná-lo a desafiar a iniciativa de Obama.
Se Trump tentar contornar essa proibição logo veremos o que
os tribunais têm a dizer. Ou, alternativamente, o Congresso controlado pelo GOP
poderá tentar aprovar um novo projecto de lei que coloca explicitamente essas
áreas de novo em praça para perfuração de petróleo e gás (embora, neste caso, tenha,
provavelmente, de passar pela obstrução do Senado primeiro o que não se afigura
fácil).
Também não é claro quanta prospecção de petróleo e gás na
realidade viria a ocorrer nessas áreas, se disponibilizadas novamente. Os
atuais baixos preços do petróleo têm assustado as empresas como a Shell de se
envolver em exploração, cara e arriscada, de petróleo no Árctico. (As
companhias petrolíferas só podem perfurar lá no verão, quando o gelo mais
espesso se derrete e, mesmo assim, sujeitas a tempestades violentas e icebergs
flutuantes que representam desafios extremos para as equipes de perfuração. Ao
longo do Atlântico, entretanto, os governos estaduais são, na sua maioria, contra
a prospecção e, provavelmente, teriam uma palavra a dizer sobre o assunto.
Em comunicado, a Casa Branca apontou a necessidade de se
iniciar o processo de substituir os combustíveis fósseis para enfrentar as
alterações climáticas, bem como os perigos de um derrame de óleo numa região como
o Árctico, ecologicamente sensível, que seria difícil de limpar (por causa do
gelo).
Esta decisão legislativa foi tomada em articulação com
o governo do primeiro-ministro Justin Trudeau, do Canadá, que colocou algumas
de suas próprias águas fora dos limites de possível exploração de combustíveis
fósseis, embora essa proibição canadiana possa ser revista a cada cinco anos.Artigo original
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